sexta-feira, 25 de junho de 2010

segunda-feira, 21 de junho de 2010

FILMOLOGIA



O Filmologia aparece num contexto agônico. Ao olhar para as nossas publicações jornalísticas, sejam elas impressas ou simplesmente feitas para a internet, o que vemos é uma grande ausência que maldosamente nos toca já que intimamente nos diz respeito – nós, que necessitamos de um diálogo sobre o cinema como um todo. Trata-se da invisibilidade da crítica, que ignora por completo o pensamento em suas milhares de páginas e que a submete, aqui e ali, aos resquícios da reportagem jornalística. Nesse contexto (que na verdade é um buraco profundo que há anos pede para ser fechado), a ideia do Filmologia é a de que se crie sobretudo um espaço para preencher o vácuo da própria “filmologia”: o relacionamento do filme com tudo aquilo que é real em nossa sociedade (tão voltada à imagem falsamente iconográfica de si mesma) e seu envolvimento com as imagens que todavia brotarão daí, tão importantes e impressionantes que merecem ser estudadas nas mais diversas áreas do Conhecimento – porque sabemos que aqui o crítico não é necessariamente um jornalista.

O site se configura como um local onde se pode encontrar críticas, artigos, entrevistas, cobertura de festivais e mostras e debates sobre o cinema feito no mundo. Como posicionamento, acreditamos na filosofia da transmissão de ideias e pensamentos através dos textos sobre filmes e sobre as demais artes, sem limitações de caracteres ou de paixão pelo cinema. Esperamos que, com o Filmologia, firmemos um pacto com o leitor para que ele tenha ao menos este local onde encontrar opiniões sobre os filmes e, porque não, sobre a vida.

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segunda-feira, 14 de junho de 2010

A NOÇÃO DO INVISÍVEL

Um ano atrás, quando comemorei o primeiro aniversário do blog, o fiz com posts referentes ao filme Twentynine Palms, meu primeiro Bruno Dumont. Desde então assisti o restante de sua filmografia e compartilhei muitas impressões por aqui (ver marcador ao lado). É no mínimo curioso que exatamente neste segundo aniversário tenha sido exibido o mais recente filme do cineasta francês: Hadewijch (2009); no Festival Varilux, e claro, lá estava eu na primeira sessão. Minha recente viagem à Maringá foi o que me impediu de dividir a experiência imediatamente, mas eis-me aqui para cumprir o que não posso mais calar.



Sinto que o fundamental, a partir deste filme, é finalmente não estar mais lidando com uma continuidade tão evidente, tão declarada, do diretor em sua caminhada autoral. Ao reler minhas postagens antigas sobre o cinema de Dumont percebo que Hadewijch avança numa contra-mão, indo de encontro aos primeiros dias de A Vida de Jesus, para a partir dali, seguir um novo caminho. Importa esclarecer que Hadewijch é o nome de uma religiosa do séc. XII que mantinha experiências estáticas com Deus e manifestava literariamente sua fé e amor (leiam aqui um breve e belo comentário biográfico). Assim, o enredo de Dumont consiste numa atualização desta persona em uma jovem noviça que, nos dias atuais, também experimenta de uma diferenciada comunhão divina.

Como dito, a proximidade deste com o primeiro filme do cineasta já se impõe pela tematização do êxtase num domínio religioso. A fragilidade do corpo da jovem (uma naturalmente iluminada Julie Sokolowski) diante do rigor na fome de seu jejum ou do frio e da chuva, logo no início da obra, testifica uma situação equivalente a que o protagonista de A Vida de Jesus vive em seus minutos finais. Aliás, revisitando minhas reflexões diante daquele filme, encontro um trecho que merece ser revisto: “[...] a espiritualidade da obra [A Vida de Jesus] se concentra toda na própria forma final, no tratamento das imagens, na maneira como seu autor se debruça sobre o mundo e seus personagens. Apesar de toda minha fé no cinema não acredito que o olhar santificado de Dumont consiga espiritualizar qualquer um dos rapazes em jogo. Há casos em que realmente isso é possível. Como se o olhar bastasse para impregnar a imagem original de sentimentos e reações outras, mais profundas e esperançosas.”

Em Hadewijch essa ação da câmera não chega a se fazer necessária pela abertura que a própria personagem carrega em seu discurso, em suas lágrimas, em seu gozo imediato pelo que ela não pode ver, mas crê existir. Assim, aquelas constantes de Dumont (Sexo + Violência) passam agora a não mais serem vistas, apesar de permearem toda a duração do filme, num outro plano. Semelhantemente ao conceito discutido pela jovem com seus novos amigos de fé islâmica: a noção divina do invisível.

Dumont pode muito declarar aos quatro ventos sua descrença em Deus, mas nenhuma palavra sua dirá mais do que seus filmes naquilo que eles provocam de indagação ao divino. Além de estarem textualmente problematizadas, em Hadewijch, questões profundamente teológicas, as mesmas dizem respeito em igual medida a uma maneira de crer o cinema enquanto um canal de possibilidades espirituais para o homem. Ora, acompanhar um diálogo que discorre sobre a presença de Deus pela ausência, sobre sua voz revelada pelo silêncio, sobre a diversa noção de visibilidade não como constatação de algo, mas como conseqüência de sentidos anteriores, é justamente adentrar em noções de reprodutibilidade da imagem, representação do mundo, noções finalmente cinematográficas.

Num determinado momento, sem eloqüência, vemos o sol abrir-se por entre as nuvens e tocar o corpo da protagonista de maneira especial. Não há ênfase, nem vemos propriamente o sol; tudo numa duração de aproximados 5 segundos, perdidos pelo filme, mas testemunhas de imagens que podem, por si, experimentarem do êxtase. Nesta cena, ao contrário de tantas outras em que a jovem demonstra claramente ser possuída pela comunhão, não há reação ou percepção que ultrapassem a simplicidade da imagem filmada. Talvez por isso uma das mais convincentes, mais próximas de Deus.

E é num exemplo assim que sinto a contra-mão de Dumont. Pela primeira vez seu cinema não carrega o peso de uma preocupação com a sutileza ou as extravagâncias do explícito; sua nova fluência parece caminhar com maior independência, justamente por demonstrar que o material visível filmado não é exatamente o que o impulsiona, mas o que chega a incomodar. Não posso afirmar preferir a novidade, pois o tratamento anterior do cineasta, todos sabem, me agrada demais; mas também não dá pra ignorar que um novo passo foi dado, de avanço ou recuo não sei ainda, mas um passo, um deslocamento que, no mínimo, se direciona para o alto, um pouco mais perto do céu, um pouco mais consciente de Deus.


Obs: enquanto não posso rever o filme e capturar meus ângulos favoritos, os cartazes com a graça de Sokolowski têm me bastado...

domingo, 6 de junho de 2010

É PRECISO VOLTAR A VER



Encontro às Escuras, James Keach, 2006.

Mais um ano de blog...

Aniversário acompanhado pelo incômodo reconhecimento de que nesse 2010 não o tenho tratado com aquele carinho que tipicamente o movimentava... Tudo bem, servir de depósito para coisas que escrevo com outros fins (diga-se outros espaços virtuais que também são ótimos) vale bastante, mas sei que voltar ao primeiro amor sempre é necessário.

Engraçado que foi num filme pipoca, assistido no recente período vivido agonicamente sem internet, que pulsou o ângulo a ser trazido pra essa postagem comemorativa. Um filme inútil sob praticamente qualquer ponto de vista, mas daqueles que adoro assistir escondido pra não ter que fingir desagrado (comédia romântica é um fraco meu, muitos já sabem). Mas foi quando o fulaninho do filme, um cego que através de uma experiência científica passa alguns momentos enxergando, olhou daquele jeito para as vozes que sempre ouvira e conhecera intimamente que... Tá, eu chorei.

O bom é poder chorar com Bergman e Bogart, mas também chorar com esses filmes sem nome, essas coisas da vida que chegam sem compromisso e se recusam a desgarrar pela boa impressão que deixam. Que a partir daqui e no decorrer do ano, esse cantinho volte a ser assim...