quinta-feira, 9 de setembro de 2010

O TEMPO QUE FERE


De Volta ao Pequeno Apartamento, Michael Powell & Emeric Pressburger, 1949.

Novo post no MAKING OFF.

Há um começo. Há um fim. A individualidade importa. O destino, o futuro. O passado que não desvanece. Tudo é essencial em De Volta ao Pequeno Apartamento. Aquilo que poderia ser mais um exemplar da profícua produção que o cinema britânico realizou sobre a Segunda Guerra, torna-se um ensaio existencial, uma reflexão sobre a crise, a interioridade fendida, consumida acima de tudo por quem não deixe esquecer a morte: o tempo.

O desespero do protagonista (David Farrar), que não esquece as dores morais e espirituais da guerra por causa de uma irreversível dor física decorrente da perda de uma perna, faz dele um retrato da própria dor. A insuficiência das alegrias, dos amores, dos ideais já perdidos, intensifica sua jornada interior rumo ao inferno, geralmente na solidão de uma madrugada, em seu pequeno apartamento.

É aí que Powell e Pressburger compõem cruelmente uma das mais atordoantes sequências já criadas pelo cinema, com trucagens milagrosas que esmagam ainda mais a humanidade em cena, seja pela forte presença do álcool e das drogas que o homem consome para suportar a noite, seja pelo aterrador tique-taque do relógio, lembrando-lhe que o tempo não pode ser vencido, desviado ou sequer ignorado.

Aqui, o tempo é quem fere. Quem condena a consciência e o corpo a uma permanência vívida, jamais em repouso. Quem faz da imagem uma habitação da dor e da desesperança, uma aceitação do fim e da derrota. De acordo com este cinema, a Guerra nunca terminou.

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