sábado, 28 de novembro de 2009

PARA MIM

Jean Renoir, ao refletir o cinema como uma arte secreta, em contraponto à impressão industrial de coletividade, afirmou que um filme é feito apenas para três pessoas.

Eu adoraria encontrar as outras duas...



Hoje completo exato 1 ano com a coisa. Com essa nova maneira de ver não apenas o cinema, mas a vida. É impressionante que em mais de 10 anos, desde o encontro com Hitchc (13/08/1999), nunca tinha precisado marcar outra data que definisse meu envolvimento com o cinema. Mas como toda boa história de amor, as datas surgem... Espero poder viver para outras.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

A DOR É APENAS A ALEGRIA QUANDO CANSA







É quase um respiro.

O fluir de um tempo que condensa o mover da relva.

Quando os dois amigos se reencontram após 20 anos e decidem adentrar pelas florestas até chegar a uma fonte térmica natural eles dão o lugar de personagem ao mundo. É quando o olhar cinemático se torna verde. Quando o tempo filmado torna-se o tempo vegetativo, o tempo das folhas.

Old Joy (Kelly Reichardt, 2006) insere-se num grupo de filmes muito particulares dessa década, inquestionavelmente devedores deste meu querido olhar gerryzante do mundo, aliados a este ultrapassar do tempo possibilitado pelo contato homem/natureza, pelo fundir do corpo-homem ao corpo-mundo, onde o fôlego de vida torna a ser uno, como de volta ao ser divino.

É o que me torna um.



Que o viver me prolongue em dor.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

O SOM DA ETERNIDADE



A melodia continua para sempre.
Enquanto o coração bater e os pulmões respirarem, você pode cantá-la para sempre.
Por isso os cadernos são cheios dessas melodias. Elas não significam nada.
Não são feitas para serem apresentadas. Nem para serem aplaudidas.
O autor não deve se curvar durante o aplauso. Não há necessidade disso.
Isso é apenas a respiração natural. Uma coisa íntima. Mas não totalmente.
É como a comunicação entre dois amigos.
Arvo Pärt


Tudo começou há um ano atrás, junto com Gerry...

Tudo se completou há algumas semanas, quando o amigo Renan, teve o cuidado de atentar para os créditos do filme e descobrir que Arvo Pärt estava lá... Mandar-me apenas a música para eu ouvir... E pela audição, pura e simplesmente, tocar novamente na coisa...

Ontem, fui abençoado pelo documentário 24 Prelúdios Para Uma Fuga (Dorian Supin, 2002), que em menos de 90 minutos impregnou minha alma com o conhecimento e a sensibilidade de um compositor que entra definitivamente no meu panteão musical particular, chegando mesmo a dar as mãos à Beethoven, com toda a humildade.

Estoniano (nascido em 1935, na Letônia), Arvo Pärt desenvolveu uma obra sem paralelos, inserida no gênero do ‘minimalismo religioso’, com melodias que se baseiam em repetições hipnóticas, no que ele chama de tintinnabuli (do latim, pequenos sinos).

Ao vermos o documentário, constatamos que a palavra realmente não é o forte de um homem que pensa musicalmente. É maravilhoso vê-lo corrigir o ensaio de uma orquestra dizendo: Esta nota deve ter algo como música, não sei o que é, mas precisa ter. Repetidamente ele afirma não saber o que quer dizer com sua música, mas que há uma idéia perfeita que ele busca alcançar, profundamente vinculada à presença de Deus. De suas limitadas e sinceras palavras, talvez as mais inspiradas sejam aquelas que comparam a nota musical à folha de uma árvore, quando ele ressalta o valor de uma folha, que para a natureza é tão importante como a flor.

Em outro momento, quando revela desejar a pausa que dure toda vida, a nota que a alma cante para sempre, me fica muito claro que a obra de Arvo Pärt almeja o domínio da eternidade.

Se a eternidade tiver som, será como o de Arvo Pärt.

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Não poderia deixar de oferecer a todos que por aqui passam os olhos, um brinde aos ouvidos, e mais, à alma. O vídeo abaixo, com a música Spiegel Im Spiegel (1976), é a cena de abertura de Gerry (Gus Van Sant, 2002), onde podemos ouvi-la como trilha.



Eu gosto quando nada acontece.
Arvo Pärt

terça-feira, 10 de novembro de 2009

EU SÓ PRECISO...








Na Natureza Selvagem, Sean Penn, 2007.

Há um tal prazer nos bosques inexplorados;
Há uma tal beleza na solitária praia;
Há uma sociedade que ninguém invade,
Perto do mar profundo e da música do seu bramir:
Não que ame menos o homem, mas amo mais a natureza...
Lord Byron

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

AINDA CONTEMPLO


Gerry, Gus Van Sant, 2002.

O ângulo acima justifica um pouco do meu recente entusiasmo com Caspar Friedrich. É inegável a aproximação entre essa imagem e a tela do último post, onde o mar e o deserto se alternam diante de um homem que constata a grandeza de um mundo que é maior.

Como negar que essas imagens comportam todo um mundo? Como posso sair dele sem me machucar?

Estou por aqui vivendo uma semana e tanto. Semana em que me dediquei a escrever um ensaio crítico sobre Gerry, o que me fez sofrer, chorar, e literalmente me desesperar diante de minha incapacidade.

Não há como racionalizar um acontecimento que é maior do que eu, maior do que qualquer palavra que eu possa proferir. Não dá.

Ontem revivi o filme para tentar mais. Só consegui descobrir que nunca deixei de vivê-lo. Que de fato a minha existência se impregnou por esse anseio de Gerry, e que me tornei Gerry e que não sei mais viver sem ser assim.

Eu sou
E contemplo
Vivo
Isso me basta

segunda-feira, 2 de novembro de 2009

CONTEMPLAÇÃO


Monge Diante do Mar, Caspar Friedrich, 1810.

Um pequeno homem beirando a insignificância contempla a imensidão da natureza. Eis uma situação recorrente na obra de Caspar Friedrich (1774-1840), romântico alemão que figurou como ninguém o poder devastador da paisagem diante de alguém que simplesmente contempla, e que nada pode fazer além disso.

Um dos nomes mais associados à manifestação do sublime em pintura, Friedrich foi um homem que soube através de suas telas refletir a incongruência do contato entre o homem e Deus, instaurando em nós, que nos limitamos a contemplar aquele que contempla, uma sensação de abismo inigualável, equilibrada entre o maravilhar-se e a impotência, a vida e a morte.

Eu me pergunto no que o pequeno monge pensa, ou mesmo se a ele é possível pensar. Talvez não reste mais do que o sentir. Constatar que a finitude do mar contamina-se pela infinutde do céu. Desejar que essa mesma imensidão o toque. Transforme. E consequentemente me alcance.

"Fecha teu olho corpóreo para que possas antes ver tua pintura com o olho do espírito. Então traz para a luz do dia o que viste na escuridão, para que a obra possa repercutir nos outros de fora para dentro."
Caspar Friedrich