segunda-feira, 17 de agosto de 2009

CHUNG KUO CHINA


Chung Kuo China, Michelangelo Antonioni, 1972.

Novo post no MAKING OFF.
(outra parceria com xKoJaKx, viramos dupla dinâmica mesmo!)

Em 1972, Michelangelo Antonioni decide partir para a China. Sua decisão foi motivada por um convite feito pelo governo do país e pela necessidade de espaço e tempo após a segunda experiência no mercado anglo-saxão, depois de ter assinado um contrato para a realização de três filmes – com distribuição internacional – para a MGM. Após Blow Up, em 1966, recebido de maneira morna pela crítica (e essa tensa relação com os críticos ocupa um particular espaço em sua trajetória), Antonioni foi violentamente atacado por Zabriskie Point (1970), especialmente nos Estados Unidos; ataques que o colocariam em defensiva não apenas em relação à imprensa, aos acadêmicos e aos colegas, mas sobretudo, às expectativas de Hollywood diante de seu cinema, do cinema italiano, de um jovem cinema europeu. Antonioni devia ainda um filme para a indústria, Passageiro: Profissão Repórter (1975), que seria realizado três anos após sua experiência chinesa. O tempo de espera, de reflexão, acontece, então, em diferentes partes do país, com as crianças que brincam em um parque, em uma cesariana, nos gestos da população. Seu filme é um retrato possível de uma nação em transformação, uma aproximação de 220 minutos entre o Ocidente e o maoísmo.

No ano de sua viagem, a China ocupava no imaginário ocidental um território entre o pânico, a euforia e a ignorância, um espaço, na verdade, que parece ser sempre o mesmo em diferentes momentos da história, como neste, agora. No final dos anos 1960, o maoísmo aparecia para uma jovem geração de intelectuais, artistas, estudantes e engajados de toda ordem como uma possibilidade, ema esperança entre a burocracia da então União Soviética e o imperialismo norte-americano. O maoísmo, como organização do Estado, da economia e da sociedade, se converteu em uma forma de romantismo político, uma moda, uma mercadoria para o consumo revolucionário. Antonioni pretendia um retrato da ‘misteriosa’ China, uma brecha pela qual os olhos ocidentais pudessem espiar, mas tudo o que pôde apresentar – uma idéia repetida por ele em sua narração em off – foi só um filme. Mas não só. Antonioni apresentou também um instante de cinema.

Cinema e filmes não são a mesma coisa. O que Antonioni experimentava nos Estados Unidos é o fato de Hollywood manter como preocupação a realização de filmes, e, nesse processo, o cinema deve aparecer se houver os ingredientes certos para que a combustão aconteça: um cineasta (e não apenas um diretor), uma idéia, coragem e uma intenção, que podem produzir um mau cinema, mas, ainda, cinema.

O crítico, escritor e jornalista francês Serge Daney, morto em 1992, aos 48 anos, e que dirigiu a mítica revista Cahiers du cinéma durante seus anos politicamente mais radicais, dizia estar o cinema e os cineastas determinados por uma questão moral: “O que é um cineasta se não alguém que em certo momento diz a si mesmo: eu não tenho o direito de filmar isso, eu tenho o direito de filmar aquilo. Penso que é seu papel tomar essa decisão, algo que nenhum outro pode fazer”. Mas Daney (que atacou China afirmando ter Antonioni filmado o país para afastá-lo do observador, como em um zoológico) acreditava também ser o cinema, como toda arte, uma relação com a herança, uma expectativa infantil, um prazer, a defesa de alguma coisa diante de alguém. Aqui, na estratégica viagem de Antonioni à China, pouco mais de trinta anos após sua passagem, é da herança, da influência e do futuro que tudo se trata. O que aproxima Michelangelo Antonioni da China? O que a China percebe em Michelangelo Antonioni?

Marcelo Rezende
(dossiê Revista Cult, jul.2005)

2 comentários:

  1. É necessário que eu conheça Antonioni?
    Aliás, me é concedido o direito de fazer essa pergunta?
    Pois é, não conheço Antonioni...

    mas estou primeiro caminhando pelas películas de Bresson...
    inclusive eu tinha de comentar isso com você! Precisamos discutir Bresson!

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  2. Tudo lhe é concedido nessa vida.
    Mas conhecer Antonioni? Isso é obrigatório!

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