sexta-feira, 5 de junho de 2009

VALSAS DE VIENA


Valsas de Viena, Alfred Hitchcock, 1934.

Eu sabia... Eu sabia que esse filme era diferente para Hitchcock. Eu sabia que a pompa, o apelo melodramático, a produção de época, tudo era único nesse filme em questão. Unicamente absurdo, pois talvez essa seja a obra mais incongruente de toda sua carreira. Eu sabia...

Mas uma coisa eu ousei esquecer: em se tratando de Alfred Hitchcock o sabor da surpresa, o carinho cinematográfico mesmo na mais banal das histórias, o toque de gênio, sempre estará presente. Eu sabia...Provavelmente essa foi a primeira vez na vida que eu me sentei diante de um Hitchcock e não esperei a obra-prima habitual. Concordo, e já expus esse reconhecimento várias vezes, há vários trabalhos do mestre que se constituem quase exclusivamente como exercícios de estilo, instrumentos para o desvelamento das possibilidades cinematográficas, das técnicas que viria usar tão conscientemente a partir de determinado ponto de sua vida e carreira (são a mesma coisa pra mim). Bem, somado a isso todo o desprezo que esse filme teve por parte do próprio Hitchc (isso nem conta muito, porque ele desdenhava muitas das melhores coisas que chegou a fazer), levando em conta que é o único filme que não recebeu nenhuma foto na Entrevista de Truffaut, e sabendo que não estaríamos dentro do suspense, eu cri: esse é só pra constar...

Ah, mas é como é bom se enganar!

É verdade, o filme não é um suspense, não é uma obra-prima, mas oferece um frescor que poucas vezes foi visto na arte cinematográfica. Biografia ficcionalizada de Strauss, o filho, conta em meio a desventuras românticas, como se deu a composição do Danúbio Azul. Puxa, confesso que nem sabia de antemão que se tratava disso! Por isso, desde início a grata surpresa! Sou fã de Strauss! E ouvir o Danúbio Azul praticamente na íntegra dentro do suporte cinematográfico era uma experiência limitada a 2001 (Kubrick).

Mas antes de discorrer sobre isso, gostaria de levantar um ponto que me impressionou muito, principalmente quando relacionado com o último filme que comentei do mestre por aqui. Se em Juno and the Paycock apontei a antecipação do recurso musical adotado pelo DOGMA 95, aqui temos um esboço do que Lars Von Trier viria fazer em Dançando no Escuro. No aclamado musical alternativo, Trier decompõe o gênero fazendo sua personagem (Björk) ouvir música nos sons naturais mundanos, como em barulhos de fábrica, ruídos de locomotiva e outras cadências rítmicas. Temos isso em Valsas de Viena! O que leva Strauss a imaginar os primeiros acordes de sua criação é justamente os ruídos produzidos pelos trabalhadores de uma confeitaria! Os pães sendo batidos na mesa, o grande processador de massa, os gestos do homens, tudo isso é o que sugere o embalo de sua nova melodia. Um momento mágico. Olha as influências de Trier aí...

Voltando ao Danúbio Azul, 34 anos antes de 2001, Hitchcock ousou inserir no filme a peça musical inteira! (o que me convence ser essa a trilha clássica mais cinematográfica que existe) Numa decupagem (ângulos abaixo) que não só anteciparia suas duas versões de O Homem que Sabia Demais, mas através de um tratamento temático que pode ser ecoado em praticamente todas as biografias de compositores que o cinema gerou (Amadeus, Morte em Veneza, Minha Amada Imortal, é... pra ficar nos meus favoritos). Ecos que também podem ser sentidos, pela imponência dos cenários imensamente vazios, na obra de Max Ophüls, e em todas as suas incursões romântico-épicas que marcaram tão particularmente o imaginário cinematográfico.

É... eu sabia. E todos sabem que em se tratando de Hitchcock todas as palavras possíveis não traduzem sua arte. Um filme para ser visto! Ah, e ouvido, claro...

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