sexta-feira, 5 de junho de 2009

O 7º CONTINENTE


O 7º Continente, Michael Häneke, 1989.

Uma família (casal e filha) subitamente decide destruir tudo que tem para partir ao 7º Continente.

É isso.
Inspirada em fatos reais, a trama contada escolhe dividir o filme (tragédia) em 3 atos distintos, que reforçam a idéia de uma fria rotina familiar. É já nessa repetição dos atos que o filme exala uma sensibilidade enfeitiçante (importante mencionar que essa é a primeira obra de Häneke parao cinema), pois particularmente, toda aquela frieza não me alcançava como algo repulsivo. Eu também sou assim, vivo numa grande rotina, e mais: adoro isso! Não gosto de mudar meu caminho, de mudar os móveis do lugar, de ver as coisas ao meu redor se transformando o tempo todo, sou uma pessoa rotineira e ponto. Por isso ao ver cada cena daquele filme não me perguntava o por quê de nada, é natural que seja assim... Além do quê, é ímpar a forma como cada ação nesse filme é captada. E aqui podemos afirmar que esse é um filme de ações. Não de personagens, de diálogos, de corpos, mas das ações que todos esses produzem. Escolher não mostrar o todo a partir de um registro simultâneo (são mais de 20 minutos sem ver a cara de ninguém!), mas optar por uma extrema fragmentação (extremamente moderna) do espaço foi o recurso que mais me deixou chapado com o filme. Detalhes, minúcias, gestos incessantes como o mais profundo pensamento... Aquela idéia atrás da idéia clariceana...

Enfim, depois falo mais das ousadias estéticas, de alguns ângulos deslumbrantes, e outras coisas que estão martelando na minha cabeça desde que vi o filme (às vezes não consgio me concentrar em nada, NADA que não seja a recapitulação de cada imagem). Há um ponto, no entanto, que preciso tocar imediatamente. Antes de dormir, a menininha sempre faz uma oração (rotineira), oração essa que repete pouco antes de morrer nos braços dos pais (acima). Ela pede:

“Querido Jesus, deixe-me eu ser uma boa garota para então eu poder ir ao paraíso.”

Após a primeira fala temos o ângulo. Enigmático. O continente almejado. Retomado inúmeras vezes até o fim, atraindo-nos para esse lugar que não se nomina ou conceitua. Lembrado pelo amigo Everardo Norões, presente na sessão, em referência a idéia de transcendência vazia de Hugo Friedrich.

Mas o que me constrange é a súplica. “Querido Jesus, deixe-me eu ser uma boa garota...” DEIXE-ME... Não: ajuda-me a fazer isso, ou, abençoa-me, guia-me, leva-me, ensina-me... Mas DEIXE-ME...

Como se O querido não permitisse... Ou tencionasse o contrário...

Preciso me calar.

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