sexta-feira, 5 de junho de 2009

O OUTRO LADO


Fanny e Alexander, Ingmar Bergman, 1982.

/.../
busco apenas
o lado que não vejo:
a chave oculta
de uma porta.
(Guaribas, Everardo Norões)

Descrever a simplicidade das coisas, de tudo que é marcado pelo visível, pelo que de mais espontâneo há na vida, com o assombroso objetivo de alcançar o inalcançável, o que fica em oculto e escapa por discretas fendas. Fendas talhadas pelo labor artístico. Disponíveis para os atentos olhos que se arriscam na leitura dos referidos versos.

A necessidade do criar, do alcançar, estampada em diversos momentos em Retábulo de Jerônimo Bosch para deixar ver/sentir o que movimenta o espírito de seu autor. É assim que percebo os trechos citados. Humildade criativa que reconhece (abaixo) a insuficiência do Eu que busca, conduzido por um maior que irrompe e revela-se sempre que o poético é tocado.

Pois o toque se consuma. A grande mão ousa rasgar o espaço simplesmente impresso para perturbar e iluminar não apenas o autor, mas a quem ele se dirige. Um toque. Um gesto do abrir a porta para deixar passar, entregar o que até então permanecera do outro lado.

/.../
E me escrevo
o último exercício de misericórdia,
enquanto a luz paralisa meus instintos
e uma grande mão
me atormenta e guia.
(Sonho um Sol Esmaecido, Everardo Norões)

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Algo para mim?