sexta-feira, 5 de junho de 2009

O SOL


O Sol, Alexander Sokurov, 2005.

Exibido numa Sessão Dissenso, O Sol constituiu-se como uma experiência inesquecível... Não exatamente pelo valor do filme em si, mas pela possibilidade de descobrir como se assistem filmes em algumas partes do mundo.

O que ocorreu foi o seguinte: André, nosso querido amigo, sacrificou-se para encontrar esse filme, trabalhar nas legendas e concluir tudo a tempo da sessão. O que ele não conseguiu evitar foi a sobreposição da dublagem gravada no filme que acabou se tornando o centro das atenções mesmo no debate final. Bem, deixa eu tentar explicar melhor essa confusão... O filme, apesar de russo, é todo falado em japonês e inglês (ponto para Sokurov no respeito aos idiomas), e para ser exibido no país do autor, a dublagem russa é gravada por cima das vozes originais. Sei que parece loucura, mas é isso mesmo. Nós assistimos ao filme com as vozes em japonês e inglês, ofuscadas por uma dublagem russa, com legendas em português!!! Com isso tornei-me um poliglota por 100 minutos da minha vida (rsrsrs)...

Como eu não sabia desse detalhe, assisti o filme inteiro pensando que esse era um recurso de linguagem adotado por Sokurov, o que prejudicou minha recepção e dispersou minha concentração na história em si, que só me despertava quando o filme se permitia alguns minutos de delicioso silêncio (poucos, mas valiosos). E eu que reclamava da dublagem brasileira...

Bem, voltando um pouco a atenção para o filme, descontando os problemas técnicos, concluo que presenciei uma belíssima obra sobre o lado humano de um homem a quem era quase impossível se lembrar disso. Digo: quase impossível de lembrar que era um simples homem. Prosseguindo na sua linha de filmes sobre personalidades históricas, Sokurov narra nesse filme a vida de Hirohito, um imperador japonês de meados do século XX reconhecido como divindade. Seus maiores momentos são justamente os que flagram esse homem consigo, parecendo experimentar o prazer de estar e se descobrir vivo. Erguer a cabeça, saltitar na grande sala vazia, apagar velas como uma criança, são pequenos gestos que roubam sua responsabilidade, restituindo-lhe o interesse pelo redor para assim assumir seu estado de ser.

Ele abandona sua divindade. Ele chora. Ecoa os passos do Imperador de Bertolucci em direção a uma liderança mais concreta e plausível (ao menos para o nosso ponto de vista globalizado). Tudo isso dentro de um cinema que se preocupa com o mínimo, com a estetização dos ambientes, dos objetos, de tudo que possa ocupar a imagem e transbordá-la.

Apesar de tudo, acho absurda a preferência da crítica a um filme como esse em lugar de Pai e Filho (2003), obra do mesmo autor que no meu panteão particular ocupa o topo cinematográfico. Não quero com isso tirar os méritos de O Sol, mas apenas expressar o que pareceu um consenso lá no dissenso.

Fica provado pra mim que Sokurov é um autor de vários cinemas. Suas diversas abordagens fílmicas, conduzidas por uma mão com estilo inegável e sempre reconhecível, conseguem imprimir em cada filme sensações díspares, o que convenhamos, não é nada fácil de se fazer.

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