sexta-feira, 5 de junho de 2009

SOU EU AÍ


Psicose, Alfred Hitchcock, 1960.

Sou eu aí.

O olhar desses ângulos é meu. E não importam os níveis de profundidade que Janela Indiscreta proporcione, não há ângulo que se compare a um desses naquele filme.

Meu olhar. Indecente. Seu também.

Se as implicâncias de um olhar fossem assim tão definitivas... Se eu soubesse que alguém me olha do outro lado...

Só um me vê.

Você.

Quero pedir desculpas a Ingrid, Grace, Tippi, e todas as outras loiras hitchcockianas que cumpriram tão bem seus papéis, mas não posso deixar passar: Janeth Leigh, em menos de 50 minutos, sintetizou tudo que uma atriz deveria ser para o mestre. Não apenas seu trabalho de atriz (a força do olhar nos jogos de campo e contra-campo, a sensualidade velada mesmo quando seminua), mas a própria constituição da persona oferecida para ela desenvolver fazem de Marion Crane uma das mais fascinantes facetas humanas com que Hitchcock lidou. Duplicada pelo espelho em inúmeros momentos do filme (recurso utilizado com quase todos os personagens, ratificando a personalidade corrompida do assassino), Marion foge do tema de ‘falso culpado’ habitual. Ela cometeu o crime, ela tem consciência durante toda a fuga que não está agindo dentro do moralmente correto, mesmo assim torcemos por ela, lamentamos sua morte (semelhante à identificação com Norman). E se antes de morrer, ela revela querer voltar, arrependida, para se redimir do erro, isso acontece para arrancar de suas costas aquela sensação desprezivelmente humana por parte dos espectadores de “bem feito”... Mas isso não cola muito comigo. Pra mim esse arrependimento não foi definitivo, foi apenas uma ‘queda’ nas suas reais intenções, pra mim, ao acordar, ela continuaria com o plano, afinal, até um assassino, antes de matar, pensa em desistir (perdoem a certeza da declaração, não se assustem tanto comigo). Enfim, essa morte não soaria como justiça mesmo que ela fosse uma vilã! Há muito mais em jogo por aqui. Sempre acreditei ser esse um dos roteiros mais completos que Hitchc teve em mãos, mérito raro, pois acho seus roteiros habitualmente dispensáveis. Creditado a Joseph Stefano, baseado em livro de Robert Bloch (ainda não li), Psicose permanece nesses últimos 9 anos como o filme que mudou minha vida.

A eternidade não é uma temporalidade continuada, mas uma intensidade.
Wittgenstein

Ah, imaginar a eternidade intensa, soberana, como no pequeno quarto de Dostoiévski, pra sempre...

Não, não dentro da nossa compreensão de sempre, mas num gozo (petit mort) infindo, tão pleno de presente que tudo o mais torna-se desconhecido.

Como no pequeno quarto dos amantes hitchcockianos,

Meu quarto

Sou eu aí.

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